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28 março 2012

A escassez se vence com a partilha!

Multiplicação 1      A Páscoa, a festa principal dos judeus, estava perto. Jesus olhou em volta de si e viu que uma grande multidão estava chegando perto dele. Então disse a Filipe: — Onde vamos comprar comida para toda esta gente? Ele sabia muito bem o que ia fazer, mas disse isso para ver qual seria a resposta de Filipe. Filipe respondeu assim: — Para cada pessoa poder receber um pouco de pão, nós precisaríamos gastar mais de duzentas moedas de prata.Então um dos discípulos, André, irmão de Simão Pedro, disse:  — Está aqui um menino que tem cinco pães de cevada e dois peixinhos. Mas o que é isso para tanta gente? Jesus disse: — Digam a todos que se sentem no chão. Então todos se sentaram. (Havia muita grama naquele lugar.) Estavam ali quase cinco mil homens. Em seguida Jesus pegou os pães, deu graças a Deus e os repartiu com todos; e fez o mesmo com os peixes. E todos comeram à vontade. Quando já estavam satisfeitos, ele disse aos discípulos: — Recolham os pedaços que sobraram a fim de que não se perca nada.Eles ajuntaram os pedaços e encheram doze cestos com o que sobrou dos cinco pães. Os que viram esse sinal de Jesus disseram: — De fato, este é o Profeta que devia vir ao mundo! Jesus ficou sabendo que queriam levá-lo à força para o fazerem rei; então voltou sozinho para o monte.          (João 6.4-15)

Quando lê esse texto, muita gente fica imaginando Jesus fazendo aparecer pão e peixe do nada a fim de alimentar todas aquelas pessoas que O estavam acompanhando. Mas eu sempre achei que se assim tivesse acontecido, seria muito injusto, muito mesmo! Afinal, ele resolveu o problema daquelas pessoas, mas e as outras milhares que, em seu tempo também sentiam fome? e os bilhões de pessoas que hoje morrem de fome? Milagrezinho safado esse de Jesus… parece até coisa da tal filosofia safada da prosperidade que enriquece os mercadores da fé!

Entretanto, não foi isso que aconteceu. O alimento que saciou a fome de todas aquelas pessoas não surgiu do nada. Houve alguém que ofereceu o que tinha para ser partilhado. Não fosse aquele menino estar disposto a dividir seus pães e peixes, Jesus não teria feito o SINAL! (no Evangelho de João, nos manuscritos antigos em grego, a palavra milagre praticamente não aparece, mas sim a palavra SINAL)

Jesus começou a dividir e distribuir o pouco que aquele menino tinha para oferecer… e então sim aconteceu o milagre: quem tinha algo partilhou com quem não tinha e então todos experimentaram a fartura, a ponto de sobrar! Eu acho que, isso sim, é um milagre porreta, como dizem lá em Recife. E muito justo! e não resolveu só o problema daquelas pessoas.

O menino apenas tinha lá seus pães e peixes; deixou que Jesus os distribuísse entre os que estavam por perto. Com certeza o menino não comeu cinco pães e dois peixes, muito menos dez pães e quatro peixes. Comeu menos do que tinha, mas comeu e ficou saciado. Mas outros que nada tinham também ficaram saciados. E ainda puderam levar o que sobrou para partilhar em sua casa.

Um SINAL para todas as épocas: dividindo, se multiplica! a quebra dos paradigmas do egoísmo: “primeiro eu!”, “isso é meu!”, e rejeitando a hipócrita resposta de muitos que se dizem cristãos: “_ Vou orar por você, é assim que posso ajudar. Deus vai resolver tua dificuldade, tenha fé!”  ou o que é pior: “Faça a sua doação para o nosso ministério que Deus multiplicará para você” (e quem enriquece é o charlatão, apesar da blasfêmia).

Nosso mundo é um mundo de fartura. Se olharmos bem as estatísticas que mostram a produção de riquezas, veremos que produzimos muito mais do que necessitamos. Todavia, somos movidos pela ganância e pelo espírito (diabólico) de rapina. O lixo das nossas cidades está cheio de alimento de boa qualidade, enquanto milhões não tem o que comer.  Terras produtivas ficam anos sem uso, acumulando valor especulativo para um futuro empreendimento que criará mercado, enquanto milhões de pessoas não têm onde trabalhar e produzir comida para si mesmas. Moradias ficam fechadas esperando melhor oportunidade de preço de aluguel ou venda, e milhões não têm onde morar com dignidade. Roupas de “grife” custam muito dinheiro, acumulando  lucro cruel para seus proprietários que enriquecem à custa de mão-de-obra escrava ou mal remunerada. A ciência médica é avançadíssima em nosso tempo, mas milhões morrem de doenças elementares. Nosso mundo é lugar onde poucos acumulam tudo e a grande maioria vive de migalhas.

Em matemática, dividir significa multiplicar pelo inverso.  Isto é, dividir um número por 3 significa multiplicar esse número pelo inverso de três. Assim, dividir é multiplicar pelo inverso: dividir dons é multiplicar pelo inverso do egoísmo, ou seja, dividir é multiplicar pela solidariedade. Por isso, dividindo, se multiplica! Um milagre matemático!

Jesus pergunta a você hoje: “Como alimentaremos tanta gente? como poderemos melhorar a vida de tanta gente? Como vamos curar tanta gente? Como podemos diminuir a tristeza de tanta gente?”

O que você tem a oferecer para ser partilhado? que dons você pode colocar nas mãos do Cristo, no exercício da divisão que é multiplicação?

Luiz Caetano, ost+

NOTA: Agradecemos os e-mails que nos são enviados comentando favorável ou desfavoravelmente as postagens deste blogue. Mas preferimos que você comente aqui mesmo, partilhando suas ideias com outras pessoas. Nós publicamos todos os comentários, inclusive os anônimos, exceto quando um comentário seja ofensivo à dignidade humana ou à nossa comunidade – mas mesmo assim, respondemos com misericórdia quando o autor se identifica.

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23 março 2012

Vida de Pastor

(aos seminaristas de hoje que realmente querem servir o Povo de Deus e não faturar no negócio religioso)

Nota: este texto foi publicado em meu blog pessoal, mas por sugestão de vários colegas e paroquianos, estou partilhando no O Apóstolo, com as devidas adaptações.

Novo sentido espiritualidade 01Quando estudava no Seminário, em São Paulo, tirávamos algumas tardes de sábado e nos reuníamos, alunos e professores, para um bate papo informal, onde o que mais acontecia era a troca de experiências e um partilhar da vida.  Bons tempos em que a gente partilhava sentimentos, emoções, esperanças e fracassos com pessoas reais, olho no olho, e não nas redes sociais.  Eu costumava anotar algumas coisas em um caderno, as coisas que chamavam a atenção, que marcavam o coração… uma espécie de registro de momentos e palavras que impressionaram minha vivência aos 22 anos.

Esses caderninhos guardo até hoje, são minha memória afetiva e intelectual.

Lembro especialmente de uma tarde, o grupo não era grande, umas sete ou oito pessoas, e o papo com um velho professor, já falecido...

O assunto correu e chegou na “vida de pastor”… o nosso professor contou algumas de suas vivências, em alguns casos rimos muito, mas de repente nos saiu com essa: (tradução dos meus garranchos no caderno e devidamente editado para ser uma postagem)

Vários de vocês estão aqui estudando porque almejam seguir o ministério ordenado. Não sei se têm ideia da loucura que estão querendo. Isso não é profissão, mas é vocação.  Não é uma carreira, mas é um caminho que sempre nos leva para um lugar sombrio: a alma humana. A tua alma e a alma dos outros.

Você precisa estar prevenido, porque aqui no Seminário, tudo é sonho e projeto, mas lá, no exercício do ministério, na solidão que isso é, a coisa é muito diferente.

Logo de início aviso que felicidade no casamento vai ser algo difícil, a menos que você encontre a esposa certa (naquele tempo mal se falava em ordenação de mulheres), que não deve ser prioritariamente crente mas tem de ter um espírito de abnegação grande e não ser ambiciosa. Um pastor é quase como um médico: tem plantão 24 horas todos os dias, inclusive domingos! Depois do culto, pode acontecer que àquele almoço na casa da sogra, tua esposa e os filhos vão, e você não vá porque a Dona Maricota foi internada e está mal, a família pede sua presença para acompanhar a situação, só que o hospital é exatamente aquele que fica do outro lado da cidade, você não tem carro e provavelmente vai passar lá o resto do dia, quando não a noite também. E, pode ter certeza, sempre aparecerá uma Dona Maricota ou uma emergência pastoral no dia do aniversário da tua esposa, dos teus filhos, no do casamento, no seu mesmo, ou no dia da confraternização da escola das crianças.

Muitas vezes você vai ficar angustiado porque teu soldo é pequeno, e teus filhos querem coisas que você não pode comprar. Tirar férias será sempre um tormento, a preocupação com a igreja e com quem poderá substituir você nesse tempo. Acostumem-se a tirar férias curtas mas pelo menos duas vezes por ano, porque ninguém é de ferro.

As pessoas da Igreja e mesmo de fora da Igreja serão exigentes com você. Você não tem o direito de errar, de ficar triste, de ter dúvidas… ninguém pensa que um pastor também precisa de um pastor, e o Bispo, que deveria fazer isso no mínimo, geralmente não faz; até porque o Bispo também precisa de um pastor, e muito.

Você terá de ser sempre o amigo, o ouvinte, o solidário, o pau-pra-toda obra. Ninguém estará interessado nos problemas que você tem, mas todos querem que você se interesse pelos problemas deles. Poucas vezes você terá um amigo, um ouvinte, alguém solidário, alguém que se ofereça para ajudar você na obra.  Você será a latrina onde as pessoas jogarão suas merdas interiores… então ai, lembre que o Cristo é bom faxineiro e sempre virá para dar a descarga. Nunca compartilhe essas merdas, deixei que o Faxineiro cuida delas, e ele tem muitas maneiras de fazer isso… com o tempo vocês entenderão. Coloquem sempre essas coisas ao pé da Cruz de Cristo e jamais comentem com ninguém, nem mesmo com quem falou com você.

Vocês dirão que Cristo é o pastor de vocês, isso é bonito, mas no dia a dia orem para que Ele seja pastor de vocês através de alguém que possa te abraçar sem medo, te ouvir e compreender que você é humano, tem sentimentos, sonhos, desejos, frustrações e também é pecador. Cercado de muita gente, o pastor está imerso em uma solidão tremenda. Nem mesmo seus colegas estarão disponíveis, por isso cuide que a burocracia da igreja não destrua as amizades que você está construindo aqui no Seminário; não se deixe contaminar pela inveja e pelo espírito de concorrência; seja humilde e lembre-se que você e todos que são pastores, são apenas servos de UM OUTRO, o verdadeiro e único Pastor.

Pense bem antes de aceitar a ordenação. Mas saiba que, se Deus te escolheu, Ele estará contigo sempre, até mesmo na tua fraqueza e no teu pecado. Por isso, reserve sempre parte do teu tempo em solidão, escrevendo, meditando, lendo, e orando, para ouvir a voz do Senhor.

Após 26 anos de vida no ministério ordenado, mesmo tendo passado a maior parte desse tempo servindo à Igreja em funções mais específicas, eu entendo e muito bem, as palavras do velho professor. Sei o quanto ele estava certo. É uma pena que hoje em dia a maioria dos que se dizem pastores são empresários da religião; pena que virou profissão.

Que Deus nos ajude!

Luiz Caetano, ost+

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08 março 2012

Cuidando da Casa da Comunidade, nosso templo!

(publicado originalmente em Pirilampos e Pintassilgos, em  25 de abril de 2011; adaptado)
celtas_thumb[8]Os celtas antigos não construíam templos; para eles, nenhuma construção humana pode conter o Divino, a não ser o próprio templo que a Divindade construiu para si mesma, ou seja, a Natureza. Assim, a religião da Antiga Tradição realizava todos os seus ritos a céu aberto. Em se tratando de uma religião da natureza, isso é bastante lógico e óbvio.
Mas os cristãos, desde muito cedo, celtas ou não celtas, constroem sua igrejas, templos onde a Divindade não habita exclusivamente, mas que se torna um espaço separado – sagrado – onde a comunidade se reúne para o louvor e a adoração. Para os cristãos, a Divindade caminha conosco na História; assim é o Deus que se revela na Bíblia. É a comunidade, não a Divindade, que necessita do templo para viver melhor sua experiência existencial com o Divino. Assim, no decorrer da História, a Igreja do Oriente e do Ocidente construiu templos das mais variadas formas, dos mais variados estilos, desde as muito simples capelas e ermidas até as grandes catedrais góticas. Todas elas como espaços de oração, vivência comunitária e descanso,  em testemunho do amor e da glória de Deus.
DSC00972O templo da São Paulo Apóstolo é uma obra de arte arquitetônica e um dos mais belos templos da Igreja Episcopal no Brasil, um templo construído entre os anos 20 e 30 do século passado, quando as técnicas de engenharia não contavam ainda com o concreto armado, tijolos refratários, tubulações seguras para a eletricidade, a água e os esgotos, cuja ventilação é totalmente dependente do desenho, ou seja, um prédio de manutenção complicadíssima e muito cara!
DSC00955E isso agravado pelo fato que, por mais de 30 anos, por diferentes razões, o edifício não recebeu manutenção adequada e ainda por cima sofreu, há alguns anos, a ação de um raio em forte temporal, estando com sérios problemas estéticos e funcionais, necessitando de restauração geral cujo orçamento está muito além dos recursos da comunidade ou mesmo da Diocese. Por isso, estamos cuidando de conseguir o tombamento do edifício, não só pelo seu valor histórico em Santa Teresa mas também como garantia de manutenção patrocinada permanente.
Uma questão se coloca na consciência de qualquer cristão: é realmente importante a preservação e a conservação deste templo? vale a pena buscar recursos de monta para isso diante de tantas urgências que se colocam para a Igreja?
Como comunidade paroquial afirmamos que a manutenção deste templo, sua restauração e conservação é – também – uma urgência para a Igreja. São vários os motivos que justificam tal postura ética.
Em primeiro lugar, a comunidade necessita do espaço sagrado para sua vida de adoração, estudo e convívio. Claro que para isso bastaria um espaço simples e barato, mas nós recebemos este templo como herança dos ancestrais da comunidade, as gerações que antes de nós e sob a mesma identidade (Igreja de São Paulo Apóstolo) construíram e partilharam esse templo em sua caminhada na história.  Honrar essa memória e essa história é uma responsabilidade que a comunidade de hoje tem e a de amanhã terá de assumir, bem como toda a comunidade maior da Igreja (Diocese e Igreja nacional).
INTERIOR DO TEMPLO PEQEm segundo lugar, o templo da São Paulo Apóstolo é parte da história de Santa Teresa, parte de sua herança arquitetônica, e um dos mais belos edifícios religiosos do Rio de Janeiro pela sua simplicidade e ao mesmo tempo grandiosidade! (características do estilo gótico: simplicidade decorativa, iluminação e grandiosidade estética). Além de ser uma referência turística, o templo e o complexo paroquial têm servido como espaço de serviço e acolhimento de muitas iniciativas da população do bairro. A comunidade, de formação ecumênica, abre o seu espaço sagrado para outras atividades, especialmente culturais e artísticas e até mesmo como local de repouso e acolhida, como testemunho do amor de Deus por todas as pessoas, o Deus que não exclui mas que busca ser presença e companheiro de cada ser humano.
Em terceiro lugar, é dever da comunidade preservar o seu patrimônio, patrimônio da Igreja Diocesana, construído com as ofertas generosas recebidas de seus membros e irmãos e irmãs de outras comunidades pelo mundo.
Com a graça de Deus temos conseguido, como comunidade paroquial e diocesana,  com a ajuda de muitos amigos e amigas, enfrentar o desafio e preservar com gratidão o legado que recebemos dos pioneiros que deram início à Missão de São Paulo Apóstolo no morro de Santa Teresa em 1917, e das seguidas gerações que mantiveram este templo aberto a serviço de Deus e acolhendo todas as pessoas.
Nosso sonho é ter nosso templo totalmente restaurado em 2017, ano do centenário da comunidade! Se você deseja contribuir com essa causa, entre em contato conosco!
Rev. Luiz Caetano, ost+
Note bem: Nossa administração é plenamente transparente! O relatório mensal da Tesouraria está sempre disponível no mural interno de templo, e em breve estaremos divulgando o mesmo na Rede Mundial, de forma a permitir o acesso publico às nossas informações financeiras. A Paróquia é administrada pela Junta Paroquial, composta por membros plenos da Igreja, eleitos em Assembleia Paroquial, de acordo com a ordenação canônica da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil e da Diocese Anglicana do Rio de Janeiro, que supervisiona a administração paroquial. Não cobramos serviços religiosos, e a Paróquia é mantida pela Contribuição Regular de seus membros, ofertas especiais recebidas de pessoas e instituições do Brasil e do mundo, além da importante subvenção da Diocese, para quem também damos modesta contribuição como Quota Diocesana, formando o recurso que é distribuído em bens e serviços para todas as comunidades. Parte significativa das coletas nos ofícios religiosos regulares é destinada a entidades de serviço social com quem temos parceria e outros projetos sociais comunitários. Os proventos do Pároco são garantidos pela Diocese (somos subvencionados); nosso Coadjutor presta seu serviço voluntariamente, recebendo apenas uma ajuda de custo para transporte. Todas as despesas da casa paroquial são patrocinadas pelo próprio pároco, por opção do mesmo. Tudo que temos e fazemos, é pela graça de Deus e a solidariedade que anima o povo cristão (Igreja) de todo o mundo.
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