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13 novembro 2011

Jesus Cristo, Rei do Universo

cristo_reiA Festa de Cristo Rei encerra o ano litúrgico da Igreja, é celebrada no último domingo do Ano Cristão. É uma festa móvel, pois o calendário litúrgico é organizado a partir da Páscoa, que depende do ciclo anual da Lua. Este ano a Festa de Cristo Rei acontece no domingo 20 de novembro.
A Igreja termina assim o ano litúrgico, que começa no Domingo do Advento (este ano, dia 27 de novembro) com o anúncio da vinda do Redentor, afirmando a vitória e o reinado de Cristo. No tempo litúrgico a festa simboliza o final da História com a chegada do Reino.
A afirmação que Jesus Cristo é o Rei do Universo completa o ciclo de pregação do Evangelho. O Advento fala de Esperança com a vinda do Menino, celebrado no Natal e manifesto no tempo da Epifania. O Tempo da Quaresma se interpola em seguida, para recordar à Igreja o Mistério do Cristo Senhor que, sob a forma de Servo, carrega conosco a cruz da existência, com nossas dores e frustrações, consolando e abrindo caminhos de libertação para todas as pessoas. A Páscoa celebra essa esperança que se concretiza no testemunho do Cristo Ressuscitado, encerrando-se o ciclo Pascal com a Festa da Ascensão do Senhor. Em seguida vem o tempo de Pentecostes, também chamado de Tempo Comum, período em que a Igreja reflete sobre os atos de Jesus, seu ensino e pregação, sua caminhada na História humana. É esse período de pós-Pentecostes que se encerra na festa de Cristo Rei, consumando assim o ciclo de esperança e vitalidade que anima os cristãos.
Dar a Jesus Cristo o título de Rei do Universo é uma maneira de afirmar seu Senhorio, é afirmar que Ele é o Senhor! Mas que Senhor é Ele?
Os primeiros cristãos foram perseguidos pelo Império Romano não exatamente por causa da sua religião, mas pela forma como confessavam a sua fé. Afinal, no Império Romano, mais que hoje, havia total liberdade religiosa. O Império dependia da arrecadação de impostos, especialmente nas terras estrangeiras conquistadas. Isso só seria conseguido sem grandes problemas, mantendo-se os povos conquistados em paz com o Império e até mesmo gostando de ser parte do Império. Havia de ser garantido a qualquer custo, o pão e o circo! Nesse sentido, os Romanos sempre souberam respeitar as culturas dos povos submetidos ao Império e assim, as respectivas religiões.
Havia uma única exigência: a submissão ao Imperador, que era chamado de Pontifex Maximus, um titulo que lhe dava autoridade suprema sobre todas as religiões! como se o Imperador fosse o Sumo Sacerdote de todas as religiões praticadas no Império.  Ao mesmo tempo, o Imperador também tinha o título de Kyrius (Senhor Supremo), ou seja, tudo estava debaixo de seu poder e sua autoridade.
Isso era problemático em se tratando dos cristãos. Em primeiro lugar a consciência de que o Sacerdócio é único em Cristo. Assim, todos os cristãos e cristãs são sacerdotes – cabendo ao clero exercer esse sacerdócio por delegação da comunidade onde serve, ou seja, não há outro sumo sacerdote senão Jesus Cristo. Também o Imperador estava sob a autoridade do Sacerdócio de Cristo. Em segundo lugar, os cristãos davam a Jesus Cristo o título de Kyrius, Senhor Supremo! e assim, o Imperador estava também sob a autoridade moral e política de Cristo!
Pode-se perceber o quanto isso ameaçava a solidez do Império. Ao afirmar que há um único Kyrius e que este é Jesus Cristo, todas as pessoas ficam no mesmo nível: todas são igualmente submissas à autoridade suprema de Cristo – o Filho de Deus, o Deus Encarnado na História e na sociedade humana. Não haviam mais senhores e escravos, nem inimigos, pois todos estavam sob o reinado de Cristo. Por isso, soldados cristãos se negavam a combater contra outros soldados cristãos… até a disciplina militar estava ameaçada!
Portanto, os cristãos significavam um risco político muito sério, pois o poder absoluto do Império era negado! e isso se tornava uma grande ameaça. Por isso, antes de serem condenados, os cristãos presos eram chamados a cuspir ou a pisar a figura de Cristo. Se isso fizessem estavam demonstrando que não O consideravam Senhor Absoluto… se não fizessem isso, eram condenados à morte. Esta é a razão do martírio de muitos cristãos na Igreja dos primeiros séculos: não se submetiam de forma absoluta ao poder de César e seu Império.
Podia-se crer no que se quisesse, podia-se adorar ao deus que se desejasse, desde que a submissão ao Imperador e assim, ao Império, não fosse questionada nem negada.
A famosa frase “Jesus Cristo é o Senhor!”, que há alguns anos aparecia pichada em paredes e nas rodovias, e hoje é tristemente utilizada na mercantilização do sagrado, é exatamente a expressão da fé da Igreja de Cristo  desde seus primórdios.
Assim, festejar Jesus Cristo como Rei do Universo é afirmar que todos os impérios e todos os poderes humanos, de todos os tempos e lugares, não são superiores a Jesus Cristo, Deus Encarnado, O Senhor!  Não há poder absoluto acima de Deus, e Jesus Cristo, “sentado à direita do Pai” (no dizer dos Credos, significando que exerce o poder de Deus) é o Senhor.
É essa mesma fé que confessamos hoje e sempre, como cristãos, e esse é o sentido da festa do Cristo Rei. Ao término do ciclo anual da Liturgia, a Igreja reafirma – como sempre fez desde o princípio – que sua própria existência está subordinada ao Cristo e não a qualquer poder humano, civil, militar ou religioso.
As pessoas que detém autoridade na Igreja, sejam membros do clero ou do laicato, exercem essa autoridade como serviço à comunidade de fé, e não como afirmação de si mesmos. Todo desvio disso é herética e pecaminosa.  Assim também devemos entender que as autoridades constituídas para gerir os assuntos do Estado, em nome do povo, não exercem essa autoridade para si mesmas, mas como serviço aos cidadãos e cidadãs.
A Festa de Cristo Rei no obriga a refletir e avaliar como exercemos o poder em nossas realidades cotidianas, como exercemos a autoridade que nos é delegada (como pais, como professores, como chefes em uma empresa, como patrões, como pastores, etc.) e também como as autoridades que constituímos exercem esse poder. 
A Festa do Cristo Rei nos obriga, partindo da nossa confissão de fé,  a uma reflexão crítica sobre cidadania!
Rev. Luiz Caetano, ost+
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